Por que certas críticas doem tanto?

DESPERTARAUTOCONHECIMENTOCONSCIÊNCIA

9/21/20254 min read

Por que certas críticas doem tanto? Talvez porque ainda não olhei para isso.

Introdução: a ferida invisível

Todos nós já passamos por isso: alguém faz uma crítica aparentemente simples, mas sentimos como se fosse uma flechada no peito. O coração dispara, a mente busca justificativas, a raiva sobe. Muitas vezes, reagimos mais à dor do que ao conteúdo da crítica. Mas por que será que algumas palavras nos atravessam como lâminas, enquanto outras escorrem sem nos abalar?

Talvez a resposta esteja menos no que o outro diz e mais no que ainda não tivemos coragem de olhar em nós mesmos.

A ciência por trás da dor da crítica

A psicologia explica que nossa mente possui partes conscientes e inconscientes. Tudo aquilo que não aceitamos em nós mesmos — traços de personalidade, emoções reprimidas, falhas — tende a ser “empurrado” para o inconsciente. Carl Jung chamou esse conjunto de aspectos negados de sombra.

O problema é que a sombra não desaparece só porque fingimos que ela não existe. Ela permanece ativa, influenciando nossas emoções e reações. Quando alguém toca justamente nesse ponto não reconhecido, o cérebro interpreta a crítica como uma ameaça.

A neurociência ajuda a entender esse processo. Quando recebemos uma crítica, principalmente em áreas sensíveis, o sistema límbico — responsável pelas respostas emocionais — dispara sinais de alerta. O corpo produz cortisol, o hormônio do estresse, como se estivéssemos diante de um perigo real. É por isso que sentimos taquicardia, calor no rosto, vontade de nos defender ou contra-atacar.

No entanto, quando já reconhecemos determinada característica em nós, o mesmo comentário não gera tanta reatividade. Isso acontece porque o córtex pré-frontal, região ligada à autorregulação e à consciência, consegue mediar a resposta, reduzindo a intensidade da emoção.

Em outras palavras: a crítica dói mais quando revela algo que ainda não tivemos coragem de admitir sobre nós mesmos.

A espiritualidade e a sabedoria do espelho

As tradições espirituais, de diferentes culturas, há muito reconhecem esse fenômeno. No budismo, fala-se sobre a importância da auto-observação e do não apego às imagens idealizadas de si mesmo. No cristianismo, Jesus dizia: “Por que olhas o cisco no olho do teu irmão e não percebes a trave no teu próprio olho?” A metáfora é clara: enxergamos nos outros aquilo que ainda não conseguimos aceitar em nós.

Já Jung, em diálogo com a espiritualidade, afirmava que integrar a sombra é parte essencial da individuação, ou seja, do processo de nos tornarmos inteiros. Esse movimento não significa se conformar com nossas falhas, mas reconhecê-las para que deixem de controlar nossa vida em segredo.

Sob essa ótica, quando uma crítica nos fere, ela pode ser vista não como ataque, mas como um convite. Um chamado para olhar mais fundo e descobrir quais aspectos de nós mesmos ainda estão escondidos.

O paradoxo da crítica: ferida ou portal?

É natural resistir às críticas. Nosso ego busca preservação, quer manter a imagem que construímos de nós mesmos. No entanto, a espiritualidade nos ensina que justamente aí mora a oportunidade de crescimento.

Quando uma crítica dói, ela revela uma parte de nós que ainda não acolhemos. Se temos coragem de parar, respirar e refletir — em vez de reagir no automático —, podemos transformar a dor em autoconhecimento.

O paradoxo é que, quanto mais nos aceitamos em nossa totalidade, menos vulneráveis nos tornamos ao julgamento externo. Ao acolher nossas imperfeições, tiramos das palavras alheias o poder de nos ferir.

Como acolher a sombra na prática

  1. Auto-observação consciente: da próxima vez que uma crítica doer, em vez de reagir, pergunte-se: “O que exatamente me feriu nessa fala?”

  2. Nomear a emoção: dar nome à emoção diminui sua intensidade. Foi raiva? Vergonha? Medo?

  3. Refletir sem julgamento: pergunte-se: “Essa crítica toca em algo que eu ainda não admiti em mim?”

  4. Acolhimento: reconhecer não é se condenar. É assumir: “isso faz parte de mim, e está tudo bem eu estar em processo.”

  5. Transformação: a partir do reconhecimento, temos liberdade para mudar o que desejamos, sem negação nem autoengano.

A crítica como mestre oculto

Sob a lente do autoconhecimento, percebemos que as críticas que mais doem são, paradoxalmente, as que mais podem nos ensinar. Elas revelam as frestas por onde podemos crescer, as partes de nós que ainda pedem luz.

A espiritualidade reforça essa visão: cada encontro, cada palavra, cada desconforto pode ser um mestre disfarçado. A vida nos mostra no outro o que precisamos ver em nós.

Conclusão: da dor ao despertar

Então, por que certas críticas doem tanto? Porque são espelhos de algo não resolvido dentro de nós. São convites, ainda que desconfortáveis, para aprofundar o olhar sobre quem somos.

Quando aceitamos esse convite, transformamos a crítica de ferida em portal. Descobrimos que a dor não é inimiga, mas sinal de que existe algo em nós esperando ser acolhido.

E talvez essa seja a grande beleza do autoconhecimento: perceber que a vida, através das pessoas ao nosso redor, não para de nos oferecer chances de nos tornarmos mais inteiros, mais conscientes e, acima de tudo, mais livres.

Fabiana de Bom/ Novo Olhaar!

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